03/04/2020
Belo Vale, em Minas Gerais, ainda faz jus ao nome que tem, apesar de ficar bem próxima de uma das maiores áreas de mineração do Brasil. Por sua beleza inigualável, merece uma visita bem demorada.
A CIDADE
“Das mandingas do ‘Chacrinha’ às ‘Noivas do Cordeiro’, aproveite quem tem tempo, conheça tudo por inteiro.”
Belo Vale divide com a cidade de Moeda uma das áreas mais bonitas e nobres nos arredores de Belo Horizonte, da qual dista pouco mais de 70km.
O acesso é complicado e por causa disso muita gente ainda não a conhece e sequer ouviram falar sobre ela. O acesso norte é feito pela cidade de Moeda, pela via vicinal que a liga até a BR-040; já o acesso sul fica na região de Congonhas, em plena área de mineração.
Chegamos na cidade por volta das 14h, em pleno horário de verão, depois de singrarmos os 13km que a separa da cidade de Moeda, rodando metade desse percurso em terra batida nas margens do Rio Paraopeba.
O acesso ao centro histórico foi complicado com a falta de sinalização adequada, mas lá fomos nós mesmo assim. Em segundos chegamos ao grande viaduto em forma de “Y”, que transpõe tanto a linha férrea como o rio.
MATRIZ DE SÃO GONÇALO
A visão mais imponente é da restaurada Matriz de São Gonçalo, construção em estilo barroco de 1758 que fica de frente para o Rio Paraopeba e é ladeada por singular pracinha, com coqueiros imperiais.
Embora o templo carregue consigo muitas modificações ao longo de sua existência, em especial em sua fachada, é de se notar a pouca interferência de estilos arquitetônicos posteriores, mantendo-a preservada em sua originalidade.
MUSEU DO ESCRAVO
Na área posterior da Igreja está a Biblioteca Municipal e o Museu do Escravo, esse último junto ao Salão Paroquial, atraindo milhares de pessoas todos os anos para apreciarem seu acervo.
De nossa parte não vemos graça alguma em apreciarmos instrumentos de torturas e suplícios utilizados há bem pouco tempo no país, os quais ainda levam muitos a tecerem comentários jocosos e cheios de preconceitos.
Vemos, outrossim, a utilidade de tais projetos para estudos da história, da antropologia e outras ciências que visem a harmonia do ser humano com o mundo que vivemos.
De qualquer forma trazemos ao leitor algumas imagens do Museu, para aqueles que apreciam.
ESTAÇÃO FERROVIÁRIA
acervo histórico da cidade
O bonito e bem conservado complexo arquitetônico e paisagístico da Estação Ferroviária de Belo Vale não tem hoje sua utilização original, mas é parte integrante da história da cidade.
Originalmente pertencente a Estrade de Ferro Central do Brasil, a Estação de Bello Valle foi inaugurada em 1917, juntamente com o trecho de linha que ligava a Estação de João Ribeiro a Belo Horizonte.
Atualmente somente os trilhos são utilizados diuturnamente por composições que levam minérios dos canteiros de obras de Congonhas para BH, sendo a cidade mera escala no trecho.
RODANDO EM BELO VALE
Com dezenas de Distritos distribuídos em sua considerável área territorial (365,4km2), a população concentrada na sede do município é minúscula, principalmente se contarmos que pouco mais de 7,5mil belo-valenses compõem a totalidade de sua população.
As ruas do município serpenteiam os aclives das duas margens do vale do Rio Paraopeba, numa sucessão de subidas e descidas onde a região comercial típica não é bem definida, mas distribuída espaçadamente entre os logradouros centrais da cidade.
Rodamos por boa parte de Belo Vale, nas duas margens do Paraopeba, e pudemos notar nela características de uma cidade operária, com muitos maquinários agrícolas estacionado nas vias públicas e a falta daquela calmaria típica das cidades interioranas mais conservadoras.
Por lá se respira trabalho e esforço de seus moradores para melhorias que a cidade precisa, o que se pode notar nos bem cuidados monumentos públicos, no casario preservado e no trato amável com os visitantes.
O incomodo maior talvez seja o frequente vai-e-vem dos trens, “apitando e chamando os que sabem do trem”, principalmente no período noturno, mas não ouvimos dos moradores qualquer queixa nesse sentido.
Como já tínhamos almoçado em Moeda, cuidamos de nos refrescar no Açougue do Paulo. Isso mesmo: sentado na calçada e trocando conversa fiada com seu proprietário, enquanto bebíamos um refrigerante geladinho, depois de um delicioso sorvete.
QUILOMBO DO CHACRINHA
A tarde estava para cair e resolvemos apertar o passo para nosso próximo destino, mas não sem antes vermos as “Ruínas da Chacrinha”, ou a “Chacrinha dos Pretos”, como também é chamado o quilombo.
Situada a 9km da sede do município, metade do acesso é feito pela MG-442, que liga Belo Vale a BR-040, e a outra metade por encantadora estradinha asfaltada, que serpenteia o Vale do Paraopeba.
Seus habitantes descendem de escravos que trabalhavam nas fazendas locais, parte deles na fazenda de Boa Esperança, com pinturas do famoso Mestre Athaíde e que possuía enorme corpo de escravos. É reconhecido como quilombo pela Fundação Palmares desde 2007.
Lá fomos recebidos pela “Tuquinha” e pelo seu filho, que nos levou para conhecer as ruínas que formam o sítio arqueológico do quilombo. A entrada no local é sacramental, já que os moradores de lá reverenciam as ruínas com muito respeito.
Conta-se que no passado era a casa sede da fazenda do “Coronel Milhão-e-Meio”, apelido jocoso do Coronel José de Paula Peixoto que possuía cerca de 1200 escravos e se dedicava a extração de ouro e a agricultura de subsistência.
Os mesmos comentários dão conta que o Coronel tomou para si como esposa uma de suas escravas que, depois da morte do fidalgo alforriou todos os demais cativos, ganhando o respeito de todos.
Tuquinha é a líder da comunidade e cozinheira de mão cheia, especialista no ora-pro-nobis, prato típico daquela região, cuja receita nos confidenciou em apartado.
Não é a toa que o único restaurante típico de lá, “Sabor do Quilombo”, fica em sua casa, onde normalmente serve os visitantes com indumentária típica africana e cardápio simples como arroz com palmito, feijão arrumadinho, pastel de angu e até comidas veganas.
O quilombo tem ainda uma vocação mais elevada. Graças ao apoio governamental e o devotamento de vários membros da comunidade, hoje é um ponto de cultura da cidade com aulas de capoeira, dança, teatro, artesanatos diversos, bem como atração em outros projetos culturais, sociais e ambientais, como o Projeto Ecovila e o Projeto de Tombamento das Ruínas da Chacrinha.
NOIVA DO CORDEIRO
Um dos povoados mais afastados da sede do município e encravado na mata, longe das mineradoras, tem sido destaque internacional e objeto de curiosidade dos solteiros de todo o mundo.
Infelizmente não estivemos pessoalmente lá em nossa viagem, mas mesmo assim vamos contar o “causo” da forma que nos contaram, dado a relevância do lugarejo.
Distante 17km de Belo Vale e com o trajeto todo em terra batida, as primeiras e desencontradas informações dão conta que trata-se de uma comunidade formada apenas por mulheres bonitas em busca de maridos, o que causou assedio de homens de todas as partes do mundo, inclusive de cunho machista, preconceituoso e discriminatório.
A história atrás do mito, entretanto, é intrigante e cheia de romances. A fama negativa vem dos últimos anos do século 19 (ou primeiros do século 20), quando dona Senhorinha de Lima abandonou o marido com qual casou por imposição dos pais e foi morar lá com o amante, de quem já estava grávida.
A afronta redundou na excomunhão dos hereges e na discriminação das mulheres de lá como sendo prostitutas. Tais acontecimentos isolaram a comunidade perante a vizinhança por muito tempo, piorada com a chegada de um pastor evangélico na década de 1950, que se casou com Dona Delina, uma católica descendente de Dona Senhorinha.
Porém, na virada do terceiro milênio Noiva da Colina arregaçou as mangas e deu a volta por cima, o que lhe rendeu a pecha atual de “local de mulheres bonitas em busca de marido”.
Sendo uma comunidade com poucas famílias, muitas morando no mesmo casarão e dedicadas a agricultura, artesanato e até com uma pequena fábrica de roupas, e com os homens da região trabalhando fora do lugarejo, os falatórios multiplicaram, principalmente depois do documentário feito por Alfredo Alves, cujo vídeo está no Youtube para ser pesquisado.
Mais uma vez a comunidade “virou a mesa” e tirou proveito dos gracejos recebidos, mas a história moderna disso tudo elas mesmo podem nos contar, pelo Facebook.
Essa nova geração de noivos-cordeirenses está sim integrada com as novas tecnologias e entende que nasceram livres para trabalharem fora ou permanecerem na lavoura; que podem casar ou permanecerem solteiros; que podem estudar fora ou criarem filhos. Nisso podemos ter certeza, afinal Keila Gaga é moradora de lá e cover oficial de Lady Gaga, levando a comunidade ao delírio com tal iniciativa.
No perfil do Facebook da comunidade temos a seguinte informação:
“Somos uma comunidade rural do município de Belo Vale/MG, denominada Noiva do Cordeiro e temos como filosofia, o Trabalho Colaborativo para manter uma qualidade de vida digna para todos, por isso desenvolvemos todas as atividades em conjunto. A Assoc. Noiva do Cordeiro, também denominada ACNC, é uma entidade sem fins lucrativos e realiza projetos Sociais e Culturais através de parceria com órgãos públicos e privados.
Nosso maior premio é conseguir viver sem brigas ou discórdias, amar todos com igualdade, confiar sem sombras de dúvidas no nosso semelhante, ter fé em Deus e saber que não necessitamos de religião para ter a vida eterna.”
Oferecem: “Atividades Culturais, Teatro, Dança e Musica, usamos a arte como veiculo de transformação, inclusão e lazer de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Sobrevivemos da agricultura e para complementar a renda da comunidade, criamos oficinas de artesanato, peças íntimas e produtos de limpeza.”
Bora conhecer? Mas é bom saber que no momento a comunidade está fechada por causa do coronavírus e só será reaberta depois que pandemia for detectada como extinta.
Fontes:
https://mdemulher.abril.com.br/estilo-de-vida/conheca-a-historia-da-cidade-das-beldades-fundada-apos-um-adulterio/
https://www.youtube.com/watch?v=cVmj1hORxso
https://epoca.globo.com/vida/noticia/2014/10/bnoiva-do-cordeirob-terra-das-mulheres-solteiras.html
Agradecimento especial
Imagens apresentadas da Noiva do Cordeiro foram gentilmente cedidas pela responsável (Márcia), depois de autorização do resto da comunidade.
Se você já conhece a região, tem alguma crítica ou sugestão para fazer, envie-nos um comentário. Será muito útil para nós.
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EDITORIAL
O Portal D Moto é um site especializado em mototurismo, com publicações semanais.
Jornalista responsável: Marcos Duarte – MTB 77539/SP
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Whats app: (11) 9-9908-5656 ACESSE TAMBÉM
Por favor,qual é o nome da música tocada durante todo o vídeo?Procuro saber já há muito tempo.
Obrigado!
Valeu pelo comentário aqui também. A musica utilizada, ela é da biblioteca do Youtube e tem o título “Morning_Mandolin”